Por Marcio Aith e Erick Matheus Nery
A decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Dias Toffoli de anular as provas obtidas pela Lava Jato no caso Odebrecht vai muito além do que dizer que o então vice-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi vítima do maior erro judiciário da história. Fontes ouvidas pelo Faria Lima Journal (FLJ) afirmam que o texto da decisão abre portas para novos desdobramentos, nacionais e internacionais. A Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) recorreu da decisão de Toffoli, que poderá reconsiderá-la ou submete-la à análise da 2ª Turma do STF. No entanto, é praticamente impossível que Toffoli reconsidere sua decisão. Assim como são quase nulas as chances de a 2ª Turma derrubá-la.
Anaixo, os possíveis impactos da decisão de Toffoli.
Primeiro, as investigações em todos os outros países onde a Lava Jato deixou “filhotes” encontram-se em risco. Esse panorama é capaz de impactar o equilíbrio político em várias nações vizinhas, em que até candidatos à presidência foram alvejados com base nas provas agora “ilegais” da Odebrecht – que, atualmente, chama-se Novonor.
O Brasil não teria sido o único país em que a empresa praticou corrupção. Propina teria sido paga também em outras onze nações, sendo nove na América Latina e dois na África (Angola e Moçambique). Os países latino-americanos são Argentina, Colômbia, Equador, Peru, Venezuela, Guatemala, México, Panamá e República Dominicana. Quase todos abriram suas próprias investigações com base nas provas obtidas ilegalmente pela Lava Jato.
Entre os investigados por filhotes da Lava Jato no exterior, o clima é de esperança. Para um executivo brasileiro processado no Chile e no Peru, ouvido pelo FLJ, Toffoli tomou uma decisão acertada que, pela lógica, também deveria anular as acusações contra ele no exterior.
Uma fonte no STF explicou que o intuito da decisão de Toffoli não foi o de anular os benefícios obtidos pela Odebrecht no acordo de leniência, mas apenas os atos abusivos derivados da obtenção ilegal de provas pelos procuradores da Lava Jato. A decisão, segundo essa fonte, deixa claro que a Odebrecht, como pessoa jurídica, também foi vítima das ilegalidades da Lava Jato, e não seria justo retirar dela os benefícios do acordo - mais especificamente, o direito a fechar contratos públicos.
Na sexta (8), o Ministério Público e o Tribunal de Contas da União (TCU) pediram à Corte que as empresas punidas pela Lava Jato sejam “perdoadas” e possam voltar a fechar contratos com o governo – esse movimento ocorre após o lançamento do Novo PAC.
Outro impacto importante da decisão de Toffoli é que ela permite aos prejudicados pela Lava Jato que entrem com processos de indenização (por danos morais ou materiais) contra as pessoas físicas do ex-juiz Sergio Moro e do ex-procurador Deltan Dallagnol.
Sergio Moro, atual senador da República, disse na rede social X, que lutará "pelo direito à verdade, pela integridade e pela democracia".
"A corrupção nos Governos do PT foi real, criminosos confessaram e mais de R$ 6 bilhões foram recuperados para a Petrobras", afirma Moro.
O ex-procurador da República e ex-deputado federal Deltan Dallagnol também recorreu ao X para manifestar sua indignação. “O maior erro da história do país não foi a condenação do Lula, mas a leniência do STF com a corrupção de Lula e de mais de 400 políticos delatados pela Odebrecht. A anulação da condenação e do acordo fazem a corrupção compensar no Brasil”, diz um dos principais rostos da Lava Jato, que prossegue:
E se tudo foi inventado, de onde veio o dinheiro devolvido aos cofres públicos? E com a anulação do acordo, os R$3 bilhões devolvidos ao povo serão agora entregues novamente aos corruptos? Os ladrões comemoram, enquanto quem fez a lei valer é perseguido.
O FLJ questionou a Novonor sobre a decisão do ministro e os impactos dela no negócio, mas a empresa disse que não se manifestará sobre o tema.
Em 2016, a então construtora Odebrecht admitiu ter entregue US$ 788 milhões em corrupção a parlamentares, governadores e ao presidente Lula durante um período de 15 anos. A empreiteira comprometeu-se a pagar uma multa de US$3,5 bilhões e abriu o que seria a caixa-preta de seu sofisticado sistema de corrupção.
Em sua decisão, Toffoli anulou todas as provas obtidas na investigação e considerou a prisão do presidente "um dos maiores erros judiciários da história do país".
O principal argumento do ministro foi o de que as provas apresentadas pelos procuradores da Lava Jato foram obtidas do exterior de forma ilegal, sem passar pelo DRCI (Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional), órgão que integra a estrutura do Ministério da Justiça e Segurança Pública. Isso porque o DRCI é a autoridade central brasileira e o canal de comunicação oficial para mediar esses processos e garante a legalidade das provas produzidas.
Para além dos contornos políticos da decisão, existe o gigantesco impacto judicial. Cerca de 400 pessoas investigadas, processadas ou condenadas pela Lava-Jato no caso Odebrecht ganharam imediatamente um forte instrumento, capaz de anular todas as acusações contra eles.