Por: Fabricio Julião
O mercado ainda projeta que o início do corte de juros no Brasil deverá ocorrer apenas no segundo semestre, apesar de condições mais favoráveis vindas do câmbio e da inflação corrente. Segundo o TC Consenso, no entanto, as apostas para o começo da redução da taxa Selic passaram a ser majoritárias em setembro, ante novembro na pesquisa anterior.
A próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, em 3 de maio, não deve ter muitos mistérios acerca da decisão sobre o patamar dos juros, com todas as projeções apontando para a manutenção da taxa Selic em 13,75% ao ano pela sexta vez consecutiva. Segundo dados do TC Consenso, formado por 23 economistas, as estimativas para o começo da derrocada da Selic ainda estão bastante divergentes, variando desde junho até abril de 2024.
Na pesquisa anterior, divulgada em 17 de março, a mediana indicava cortes dos juros a partir de novembro. Pouco mais de um mês depois, passou a ser em setembro, daqui a duas reuniões do Copom. Desde o último encontro dos membros do Comitê, em 22 de março, houve uma combinação de fatores que corroboraram para a visão de antecipação do corte de juros, mas não o suficiente para uma queda em maio ou junho.
Desde então, novos sinais de desaceleração da economia americana surgiram, reforçando temores de uma recessão global, além da apreciação cambial do real. O dólar caiu 4,21% frente à moeda brasileira entre 22 de março e 26 de abril, com a cotação da moeda americana indo de R$5,2369 para R$5,0250.
“Desde a última reunião do Copom, houve uma apreciação cambial relevante e isso ajudaria os cenários do BC. Contudo, nesse período, as commodities compensaram parte deste movimento, então o efeito líquido será pequeno”, afirmou à Mover o economista-chefe do Bradesco, Fernando Honorato.
O minério de ferro negociado em Cingapura caiu 12,4% entre 22 de março e 25 de abril, enquanto o milho desvalorizou 19,6%. A soja negociada em Chicago e o Boi Gordo na B3 também apresentaram quedas menos expressivas, de 2,05% e 1,94%, respectivamente. O petróleo Brent, em contrapartida, avançou 6,3% no mesmo período.
“Além disso, as expectativas [inflacionárias] continuaram subindo em todos os horizontes e esse tem sido um dos focos de atenção do Copom. Do ponto de vista de atividade e dados correntes de inflação, os resultados parecem estar bem próximos do comportamento esperado pelo Comitê”, acrescentou Honorato.
As expectativas inflacionárias estão fortemente ligadas à resiliência do setor de Serviços, que ainda não teve a desaceleração esperada, conforme apontou o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15 (IPCA-15) de abril e o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) de março. Os núcleos inflacionários permanecem elevados, e o setor foi o que mais teve admissões líquidas no mês passado, somando 122.323 postos de trabalho.
“Apesar da desaceleração da alta dos preços, os núcleos [da inflação] continuam rodando no nível de 7,5% ao ano e, na margem, a média móvel trimestral anualizada ainda está próxima a 8% ao ano”, destacou à Mover o economista-chefe da Genial Investimentos, José Márcio Camargo.
No comunicado da decisão de juros anterior, o Copom reforçou que mantém no horizonte a incerteza sobre o arcabouço fiscal e seus impactos sobre as expectativas para a trajetória da dívida pública, além de uma desancoragem maior, ou mais duradoura, das expectativas de inflação para prazos mais longos.
Ontem, o Goldman Sachs publicou um relatório destacando que os efeitos da política macroeconômica do governo atual, principalmente referentes à expansão fiscal e do crédito, deverão impulsionar as expectativas inflacionárias para cima nos próximos quatro anos. O banco também citou a disposição do governo em alterar as metas de inflação dos próximos anos, o que deve ser discutido na reunião de junho do Conselho Monetário Nacional (CMN). "Isso deve acomodar a inflação em um nível mais elevado".
O novo arcabouço fiscal foi apresentado ao público em 30 de maio e enviado ao Congresso em 18 de abril. O texto final trouxe dúvidas sobre os meios de arrecadação do governo para alcançar as metas propostas, mas, no geral, foi bem recebido pelo mercado, que se via às cegas em relação ao limite de gastos e à busca de estabilização da dívida/PIB.
Segundo o economista-chefe da Órama, Alexandre Espírito Santo, a entrega do arcabouço fiscal não deve impactar a decisão do Copom de maio sobre a Selic. Ainda assim, desde a apresentação da nova regra fiscal as expectativas sobre o patamar dos juros recuaram. Os contratos de juros futuros mais negociados, com vencimento em Jan/25, caíram 20 pontos-base neste intervalo. Os DIs, por aqui, caíram tendo em vista a antecipação de cortes nas taxas de juros pelos bancos centrais do Brasil e do resto do mundo, diante de incertezas sobre o nível de retração da economia global que as altas taxas têm provocado.
O TC Consenso indica que a Selic deve encerrar 2023 em 12,75% ao ano, e 2024 em 10%.