Por Lucinda Pinto
Nem o Credit Suisse, nem o Silicon Valley Bank trazem isoladamente a ameaça de uma crise sistêmica nos moldes do que se viu em 2008. Ainda assim, a retomada da tranquilidade do mercado dependerá da capacidade dos bancos centrais de controlarem o medo de que outras instituições enfrentem problemas semelhantes, em um cenário de juros e inflação elevados, afirmou o chefe de soluções em investimentos quantitativos do Santander Asset Management, Guido Chagas.
Em entrevista exclusiva à Mover, Chagas disse que, graças ao aperfeiçoamento da regulação bancária que se construiu desde a crise financeira deflagrada pela quebra do Lehman Brothers nos Estados Unidos, em 2008, a blindagem dos sistemas bancários americano e europeu é muito forte. Segundo ele, o “coverage ratio” -- índice de cobertura da dívida -- dos bancos está em nível saudável, e o nível de exposição às duas instituições é limitado.
No caso do Credit Suisse, trata-se de um problema conhecido há vários meses e, portanto, a crise já tem sido absorvida pelo mercado. “Hoje os controles são muito mais exigentes do que em 2008, e assumindo que o Federal Reserve está cuidando disso, não deveria ter problema”, afirmou.
Mas o fato da quebra do SVB ter chegado de surpresa, até mesmo para o Fed, assustou o mercado e ampliou o receio de que outras instituições venham a enfrentar crises semelhantes. Afinal, sabe-se que operações de alguns bancos e fintechs só são rentáveis em um cenário de “mundo normal”, ou seja, com juros entre 3% e 4% e, portanto, a alta de juros em curso pode inviabilizar algumas delas.
O risco, portanto, tem muito mais a ver com a reação que o investidor terá diante de todas essas incertezas. Uma onda de resgates poderia deflagrar o que se chama de “efeito manada” e, portanto, traria uma crise sistêmica. E é por isso que a resposta dos bancos centrais é fundamental neste momento. “O risco é de ‘behavioral finance’ (finanças comportamentais), é só emocional”, afirmou.
E OS BCS?
Nesse ambiente, cabe às autoridades monetárias acalmar os agentes e evitar essa corrida. A questão, alertou Chagas, é que a comunicação dos bancos centrais nem sempre é eficiente, o que significa que a volatilidade vai continuar. Além de declarações, a resposta em termos de política monetária também terá grande influência sobre a evolução dessa crise.
Chagas explicou que, hoje, o mercado está muito dividido. Uma parte dos agentes considera que o Fed deveria reduzir os juros para evitar que outros bancos tenham problemas, decisão que agravaria o cenário de inflação. Mas há uma ala que defende que o mercado de trabalho ainda forte justifica a continuidade do aperto monetário.
“Pessoalmente, acho que a melhor resposta seria dar uma alta de 0,25 ponto no juro, porque interromper o ciclo poderia sinalizar que o Fed vê problemas mais graves pela frente e assustar o mercado, enquanto subir a taxa em 0,50 ponto seria mal-visto neste momento”, explicou.
Para o Brasil, o cenário-base é de que a divulgação de um arcabouço fiscal crível gere oportunidade para o corte de juros e, portanto, para ganhos na renda fixa. “Aqui, a visibilidade ficou maior do que no exterior, o que significa que, se as coisas lá fora se acalmarem, o Brasil poderá atrair investimentos. Mas tudo isso está muito calcado em um cenário em que venha um bom arcabouço fiscal”, afirmou.
DIVERSIFICAÇÃO
Para Chagas, que é um dos gestores do fundo Renda Fixa Global lançado pela Santander Asset, que explora oportunidades de investimento em moedas, juros nominais, inflação e crédito privado em 25 países, embora desafiador, o ambiente geral abre muitas oportunidades para a renda fixa.
Porém, para aproveitar este momento, a melhor estratégia, segundo ele, é a diversificação global, uma vez que a dinâmica dos mercados hoje oferece diferentes oportunidades de risco versus retorno. “Há muita volatilidade e incerteza, mas se você não concentrar a posição é possível aproveitar as diferentes oportunidades”, definiu.