Por Juliana Machado
Os recentes receios em relação à situação de crédito de empresas como a Elfa Medicamentos e a Unigel pouco interferem nas perspectivas para o mercado de dívida no Brasil. Para especialistas no segmento ouvidos pela Mover, os riscos dessas companhias estão mapeados e nem de longe se assemelham potencialmente a situações como a da Americanas (AMER3) e da Light (LIGT3) no começo deste ano.
No fim de junho, a Elfa Medicamentos foi colocada em revisão para rebaixamento pela agência de classificação de risco Moody’s, que citou a “significativa deterioração na posição de liquidez”, a “contínua frustração de resultados” e “a geração de caixa operacional fragilizada ao longo do primeiro trimestre de 2023” como principais pontos da análise.
De acordo com a Moody’s, essa situação “provocou alta no indicador de alavancagem” da companhia e reduziu sua cobertura de juros, levando a empresa de distribuição de medicamentos e materiais hospitalares que tem o private equity Pátria como controlador a fechar março com R$159 milhões em posição de caixa e dívidas de curto prazo de R$837 milhões.
O Pátria realizou um novo aporte de R$620 milhões na companhia recentemente, segundo o site Pipeline, do Valor. “Já houve uma quebra de covenants [compromissos de financiamento com credores] no ano passado e nós já renegociamos”, afirmou um gestor que detém debêntures da companhia. “O Pátria não colocaria dinheiro numa empresa prestes a falir.”
Para esse profissional, que preferiu não ser identificado, a revisão da Moody’s já estava no preço e o aumento da alavancagem ocorreu para viabilizar a compra da fabricante de luvas, seringas e outros produtos hospitalares Descarpack. “O grande problema é que no começo do ano tivemos péssimas experiências [com Americanas] e o investidor ficou aflito, acha que isso é o padrão. Não é o padrão.”
No caso da Unigel, a fabricante de fertilizantes enfrenta um período de renegociação de dívidas, com credores pedindo que a família controladora faça um aporte de capital na empresa, segundo noticiado pela Bloomberg Línea. A piora nas condições financeiras da companhia é resultado principalmente da queda dos preços de insumos químicos enquanto a empresa investia em expansão de fábricas.
Apesar de relatos de que as negociações com credores têm sido duras na Unigel, a situação também não gera um risco de contaminação para o mercado de crédito na visão dos gestores.
“Uma eventual recuperação judicial da Unigel não impacta o público de pessoas físicas, é mais um efeito no público institucional. Mesmo assim, é um nome menos relevante para o mercado de capitais”, disse o analista de crédito de um grande banco de investimento. “Isso pode elevar um pouco o prêmio de risco, particularmente no DI+ [títulos de dívida indexados ao CDI], mas não leva a um estresse como em Americanas e Light.”
Tanto a Elfa quanto a Unigel não têm ações negociadas em bolsa, mas são importantes para o mercado de dívida porque seus títulos estão nas mãos de relevantes gestoras independentes ou ligadas a bancos. Casos como o das Americanas deixaram investidores muito mais retraídos no segmento, elevando o prêmio de risco. Gestores, porém, enfatizaram que, no caso da varejista, tratou-se de uma fraude, algo não-recorrente.
Já no caso de Light, bastante diferente de Americanas, a companhia passa por problemas financeiros devido às perdas de energia por furtos, os chamados “gatos”, no Rio de Janeiro. A companhia só consegue repassar essas perdas para as tarifas até um limite regulatório, embolsando o prejuízo caso esse teto seja atingido. Com o mercado de crédito apertado após o caso Americanas, a Light sofreu para rolar suas dívidas, o que acabou por forçá-la, em janeiro, a fazer a contratação de um escritório para assessorá-la na reestruturação financeira e levá-la a entrar em recuperação judicial em maio.
Esta reportagem foi publicada primeiro no Scoop, às 13H29, exclusivamente aos assinantes do TC. Para receber conteúdos como esse em primeira mão, assine um dos planos do TC.