Por Fernando Marx
O governo Lula tem uma capacidade impressionante de se autossabotar. Nestes primeiros meses de mandato, é bastante nítida a agressividade do presidente e seus aliados em relação a alguns temas importantes.
A mais recente e emblemática narrativa é em relação ao Banco Central. Podemos assumir que a Autonomia do BC incomoda o PT por alguns motivos: Roberto Campos Neto é uma indicação de Bolsonaro; o PT está ‘acostumado’ a ter o BC sob sua gestão; e por ser uma trava natural contra devaneios fiscais e populistas.
Este último ponto faço um destaque, afinal, se o atual governo mudar o rumo da política fiscal, o BC será obrigado a apertar o rumo da política monetária. Essa falta de liberdade incomoda o PT. Portanto, podemos assumir que o BC é um grande alicerce econômico do país.
Todavia, o interessante é que por trás de todo processo de sabotagem praticado por alguns membros do governo, existem sinais controversos e positivos em relação ao quadro fiscal. Recentemente, houve uma grande vitória do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, dentro da temática da reoneração dos combustíveis.
O retorno do imposto federal, dentro do atual contexto de necessidade de diminuir o déficit primário projetado, era essencial. A vitória, infelizmente, foi acompanhada de uma medida bastante negativa para o livre mercado: a taxação de exportações de petróleo cru.
Apesar desta grande e nem tão esperada vitória da Fazenda, continuamos vendo os juros futuros em uma espiral de alta e o Real se desvalorizando em relação a moedas de outros países emergentes. Isso prova que ainda há um grande ceticismo com relação ao governo e sua agenda fiscal.
A medida prática positiva de reonerar os combustíveis acabou menosprezada em um ambiente de muito ruído. Para que as vitórias da ala econômica possam trazer o resultado esperado, será necessário um ambiente de silêncio. Lula precisa parar de sabotar seus ministros responsáveis por lidar com as expectativas fiscais dos investidores.
Certamente não se reduz o ruído quando o chefe de Estado perde a postura e repetidamente chama o presidente do Banco Central de “cidadão” - mesmo termo, diga-se de passagem, utilizado para referência ao ex-presidente Jair Bolsonaro. O silêncio em relação a este tema certamente ajudariam os juros a cair.
Agora, a próxima cruzada será a do arcabouço fiscal, capaz de confirmar melhoras recentes em relação às preocupações fiscais do governo, ou piorar de vez o cenário. O projeto será entregue em breve e, caso consiga ancorar expectativas em relação ao endividamento futuro do governo, pode ser o primeiro grande sinal estrutural de que os juros podem cair.
Mas a Selic só vai cair se o ruído não falar mais alto que a mudança prática e estrutural. Ruídos que ensurdecem podem, mais uma vez, anular os efeitos positivos esperados de uma medida prática razoável. É hora de descer do palanque, Lula.
*O conteúdo da coluna é de responsabilidade do colunista e não reflete o posicionamento do FLJ