Coluna
Publicado em
14/4/2023 17:52

Governabilidade Emprestada

Para colunista, governo depende do presidente da Câmara, Arthur Lira
Componente decorativo no bloco representando as cores do FLJ.
Agência Brasil

Por Lucas de Aragão

Nos governos Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), Lula (2003-2010), Dilma (2011-2016) e Michel Temer (2016-2018) era muito comum ter na memória o tamanho da base aliada do governo. Ainda que por diferentes motivos a obviedade do tamanho desta base tenha variado entre esses governos, ainda era possível saber aproximadamente o número de votos governistas.

De uns anos para cá a governabilidade mudou. Parte importante dessa mudança de poder tem a ver com a autonomia crescente do Congresso Nacional, que hoje comanda boa parte do orçamento, conta com emendas impositivas (em um passado recentes as emendas eram autorizadas ou não pelo Poder Executivo) e exerce poderes que no passado eram quase ignorados, como a derrubada de vetos. Mudanças regimentais também fortaleceram o Parlamento, tirando do Poder Executivo o controle quase total que tinha sobre a pauta.

Mais recentemente outro fenômeno tem acontecido e seguirá acontecendo novamente no Governo Lula III: a governabilidade emprestada. Antes de explicar exatamente o que é, vamos dar um passo para trás. 

A grande força motora da organização política no Congresso Nacional foi, por décadas, os partidos políticos. É importante também mencionar a coesão e organização das bancadas temáticas, como a Bancada do Agronegócio e a da Segurança Pública. Formada por parlamentares de diferentes partidos, mas que defendem uma causa em comum, o humor das bancadas tem influência não apenas em votações setoriais, mas em todo o conjunto de forças do Congresso Nacional. 

Desde que a polarização entre direita e esquerda no Brasil se acentuou, com claras tendências regionais, os partidos do centro passaram por uma reformulação. Por um lado, se fortaleceram. Afinal, sem defender uma clara bandeira ideológica, é possível acomodar todos. Há inúmeros casos no PSD, MDB, PP, entre outros, de deputados que foram eleitos apoiando Lula e outros apoiando Bolsonaro. Por outro lado, ao se encontrarem em Brasília, esses parlamentares, muitas vezes, não conseguirão seguir uma mesma linha, enfraquecendo a capacidade de partido de se organizar.

A consequência disso é uma governabilidade absolutamente imprevisível e diferente do passado. Na Câmara o governo conta com aproximadamente 140 deputados federais. São parlamentares de esquerda, prontos para atuar em muitas batalhas do Governo Lula. Ainda faltam muitos para que se atinja maioria simples, absoluta e principalmente constitucional. A atração de partidos para a base, tradicionalmente feita a partir de espaços em Ministérios e outros órgãos públicos, não é tão trivial, dada a fragmentação ideológica.

Nasce um fenômeno de tudo isso, a governabilidade emprestada. Hoje os dois principais organizadores de maioria no Congresso são Arthur Lira, presidente da Câmara, e Rodrigo Pacheco, presidente do Senado. Gira em torno dos dois, principalmente de Lira, a capacidade de organizar maiorias. Lira é fruto de um processo de acúmulo de poder do Poder Legislativo e do centro político.

O governo terá sucesso quando atrair Lira em um determinado assunto. O governo deve fracassar quando o engajamento de Lira for neutro ou negativo. Vamos olhar alguns exemplos práticos.

Nos últimos dias Lira tem elogiado a proposta do novo arcabouço fiscal. Esse apoio suavizará a tramitação do projeto, que deve ser aprovado sem grandes sustos, ainda que com mudanças. Por outro lado, a Medida Provisória que altera o CARF foi recebida de forma mais morna pelo Presidente da Câmara, que criticou publicamente pontos relevantes da proposta. O resultado é uma proposta que passa por muitas dificuldades. Os decretos recentes que alteram pontos do Marco do Saneamento sofrem com uma enxurrada de questionamentos políticos e legais avalizados por Lira. 

Há outras variáveis, claro, como o humor do mercado, as pressões setoriais, a percepção das redes sociais, a cobertura da imprensa e o apoio de outras lideranças políticas. No entanto, a variável chave será a capacidade do Governo em atrair Lira e Pacheco, principalmente o primeiro, para suas pautas.

Teremos um ano volátil em relação a governabilidade. Prevejo que em uma curta janela de espaço o governo terá enormes sucessos, com votações explosivas, e contundentes derrotas. A base aliada do governo seguirá abstrata, expandindo quando conseguir atrair apoios como o de Lira, retraindo quando não.  

*O conteúdo da coluna é de responsabilidade do colunista e não reflete o posicionamento do FLJ

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