Coluna
Publicado em
19/5/2023 13:23

Evolução Regulatória dos Criptoativos

Colunista apresenta um panorama histórico e atual do mundo cripto
Componente decorativo no bloco representando as cores do FLJ.
Pixabay

Por Jorge Souto

Os criptoativos transformaram a economia global na última década, despertando o interesse dos reguladores. Apresentaremos um panorama histórico e atual da evolução regulatória nos principais mercados de cripto e discutirei os próximos passos.

Nos Estados Unidos, a regulamentação de criptoativos tem sido um processo gradual e complexo. Em 2014, o Departamento de Serviços Financeiros de Nova York (NYDFS) criou a BitLicense, uma licença para empresas cripto operarem no estado. Essa licença foi mal recebida pelo mercado devido às restrições extremas, levando muitas empresas a optarem por não operar no estado. A Comissão de Valores Mobiliários (SEC) assumiu a liderança, especialmente após 2017, com o surgimento das ofertas iniciais de moedas (ICOs). A SEC aplicou as leis de valores mobiliários existentes a esses novos ativos, considerando muitos deles como "títulos". A Comissão de Negociação de Futuros de Commodities (CFTC) também se envolveu, classificando o Bitcoin como uma commodity em 2015.

Na Europa, a abordagem tem sido mais descentralizada, com cada país membro da UE adotando suas próprias regras. No entanto, a tendência geral é de maior regulamentação e supervisão. Em 2020, a União Europeia propôs o Regulamento de Mercados de Criptoativos (MiCA), com o objetivo de estabelecer um quadro regulatório único para toda a UE. O MiCA foi recentemente aprovado e entrará em vigor em 2024, com o objetivo de proporcionar maior clareza legal, proteger os consumidores e apoiar a inovação e adoção de criptoativos na UE.

Por outro lado, a China adotou uma postura mais restritiva em relação aos criptoativos. O Banco Popular da China (PBOC) proibiu as ICOs e fechou as exchanges de criptoativos locais em 2017. Em 2021, a China deu um passo ainda mais drástico, proibindo todas as atividades relacionadas a criptomoedas, incluindo a mineração. No entanto, a China está desenvolvendo sua própria moeda digital, o yuan digital, como parte de sua estratégia para controlar e centralizar o uso de criptoativos no país.

Outros países também estão se destacando em termos de regulação. O Brasil já possui uma lei que abrange o setor e os reguladores procuram incentivar a inovação. A Suíça possui leis bem elaboradas e tem sido um centro relevante para startups do setor. El Salvador foi além e adotou o Bitcoin como moeda de curso legal (Legal Tender).

Apesar das abordagens regulatórias passadas, estamos presenciando uma série de mudanças surpreendentes. Os Estados Unidos adotaram uma postura hostil em relação ao setor. O governo democrata, influenciado por políticos como Elizabeth Warren, está tentando sufocar o setor utilizando reguladores como o NYDFS, FDIC e principalmente a SEC. O problema é que atualmente não existem leis específicas para o setor e as empresas afetadas, como a Coinbase, estão lutando nos tribunais para obter mais clareza. O Congresso, liderado pelos republicanos, também busca coibir o executivo de legislar ao aplicar regras atuais a uma nova classe de ativos. O grande questionamento é como um país que é historicamente líder em inovação e novas tecnologias busca expulsar entidades que trabalham corretamente? Quanto potencial futuro será deixado para ser capturado por outras jurisdições?

O mercado cripto é global, com alto grau de descentralização e mobilidade. Essas características são importantes, pois criam um cenário de tensão competitiva entre os países. Falamos como a China sempre teve uma postura mais restritiva com a classe de ativos, mas ao ver a postura americana, uma oportunidade surgiu. Beijing busca agora uma reaproximação com o setor. O governo de Hong Kong está implementando novas leis e regulações mais amigáveis a fim de atrair empresas, investidores e fluxo para a cidade, tudo com aval do governo chinês.

A Europa, com a MiCA e o Reino Unido, também está buscando incentivar o setor dentro de suas fronteiras. A Europa perdeu o bonde das empresas de tecnologia por não ser tão receptiva quando os EUA nas décadas passadas, o que prejudicou bastante o crescimento do bloco econômico nesse período. O Reino Unido busca preencher a lacuna deixada pela saída de empresas financeiras após o Brexit. Outros países também buscam atrair empresas cripto. O Brasil com regulação amigável e uma lei específica para o setor. A Suíça com leis muito bem desenhadas e que fomentam inovação. Países da Ásia como Japão e Cingapura, com leis bastante claras e limites definidos. Os casos são muitos. Atualmente, nos grandes mercados, a postura americana é uma exceção, comparável a países como Venezuela e Bolívia que são muito reativos ao setor.

Até quando o atual governo americano conseguirá lutar contra a evolução tecnológica? Historicamente, brigar com tecnologias não traz bons frutos. Se os Estados Unidos deixarem uma lacuna aberta, outros países aproveitarão e capturarão o crescimento no futuro. Acredito que em alguns anos, quando olharem para trás, os políticos e a população perceberão como os ataques ao setor não fizeram sentido e como permitiram que outros países ganhassem relevância, assumindo que não mudarão de curso. Apesar do cenário atual, acredito que as próximas eleições trarão uma renovação relevante no legislativo e executivo, com pessoas mais jovens assumindo a liderança e adotando uma postura mais amigável em relação ao setor.

*O conteúdo da coluna representa a opinião do colunista e não do FLJ

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