Por Ordoardo Carsughi
No artigo da semana passada, citei uma estratégia que desenhei para ter sucesso na carreira. Muitas pessoas querem estar no comando da carreira, no “driver’s seat”, mas acabam ficando no “passenger’s seat” ou no banco de trás. Ou no porta-malas. Nada pior que isso para se frustrar e começar a fazer bobagens na carreira.
Falei muito também sobre o tal do “chegar lá”, “make it to the top” e outras expressões que todo mundo usa sem refletir muito. Não vou me ater a isso neste artigo, tomando como premissa que você já sabe onde quer chegar: tipo de empresa, área, nível hierárquico e etc.
Queria aqui passar alguns aprendizados que tive ao longo das minhas 3 décadas de carreira, entre trancos, barrancos e boas pitadas de emoção e realização. Agrupei tudo em 4 regras básicas, apenas para facilitar o entendimento. Não tome isso como um “playbook” de carreira, até porque odeio esses neologismos para reempacotar as mesmas coisas de sempre.
Vamos lá.
Regra #1: disciplina oriental com suas finanças pessoais
Aqui é simples. Gastar menos do que ganha, sempre. Isso deve ser encarado como um mantra sagrado, algo do que não se pode nunca esquecer. Mas por quê?
Há duas razões básicas para isso. Se gasto menos do que ganho, sobra dinheiro no fim do mês. Isso me ajuda a construir minha reserva de emergência, que é extremamente importante. Adicionalmente, se eu não me acostumo a ter o melhor que meu salário pode proporcionar, não nivelo meu padrão de vida “por cima”. A vida é muitas vezes como uma roda: às vezes estamos lá em cima, outras vezes estaremos lá em baixo. Exemplo: se me acostumo a viajar sempre de classe executiva, quando eu puder viajar apenas de classe econômica, vou sofrer. Isso é desnecessário e está em nossas mãos controlar esse potencial problema.
Takeaway: tudo isso te ajuda a fazer um pé-de-meia bacana e te poupa sofrimentos quando a grana escassear...
Regra #2: saber tomar as decisões e escolhas corretas
Pode parecer difícil, mas não é tanto assim. Primeiro, tem que ter alguém mais velho para te ajudar a refletir sobre a carreira e a vida. De preferência, alguém que a gente admire e com quem tenha liberdade. Pode ser ex-chefe, um conselheiro de carreira pago ou etc. Mas tem que ter.
Precisamos também entender que a vida até os 30 anos em geral se encontra em uma fase de consolidação da carreira e não na fase de buscar alta remuneração. Isso se faz, via de regra, depois dos 40 anos. E nessa fase de consolidação, a última coisa que se deve fazer é mudar de emprego por causa de remuneração. Isso quase nunca dá certo. As minhas piores decisões de carreira foram tomadas por dinheiro.
É muito importante também definir claramente quais as habilidades e experiências que precisamos ter para chegar na posição que desejamos. Com base nisso, as escolhas ficam mais fáceis de se fazer. Além disso, ficar pulando de galho em galho a cada 2 anos pega mal. Não adianta vir com aquele papinho de que mudei muito de emprego porque buscava algo que estivesse em linha com meu propósito de vida, que me fizesse sentir que estava plenamente realizado com minhas convicções e etc. Ninguém fala, mas no mundo corporativo quase ninguém mais acredita nisso.
Nem a menina do RH de 22 anos que faz o primeiro approach com os candidatos. Você vai ser visto como 1) um sonhador desvairado, imaturo, ambicioso demais e etc ou 2) um mentiroso que não acredita nisso mas está querendo ser politicamente correto e acha que os outros são bobos e vão acreditar na tua conversa. Além disso, a grande maioria vai pensar: poxa, se esse cara não pensou duas vezes antes de sair dos outros empregos, pode fazer isso aqui também. E se tiverem mais opções a você, te descartarão. Simples assim. Alguns até já colocam no algoritmo que vai fazer o primeiro screening do monte de candidaturas uma chave para eliminar quem fica menos de 2 anos numa empresa.
Outro ponto muito esquecido. Mudança de cidade ou país. Precisa conversar com o cônjuge antes até de buscar isso. Se isso não for uma coisa administrável para quem for te acompanhar, as chances de dar errado são enormes. O relacionamento vai ser afetado e isso vai te afetar no trabalho. Conheço alguns casos de divórcio onde o cônjuge acompanhante resolveu voltar divorciado e isso fez o sonho de carreira desandar. Watch-out, isso vai backfire na tua testa...
É importante também olhar bem a empresa que está te oferecendo uma proposta. Não vamos ser ingênuos: toda empresa tem coisas boas e ruins, assim como nós temos qualidades e defeitos (me recuso a escrever fortalezas e oportunidades de melhoria). Faça uma busca por info de quem conhece a empresa. Vá no glassdoor e etc para ver o que descobre. Mas tente se cercar ao máximo de fatos e dados para mitigar uma possível decisão errada.
Mas e se descobrir que entrei numa cilada?
Ah, aí entra em campo a reserva financeira que mencionei lá atrás na regra #1. Com alguns meses de dinheiro no bolso, você consegue sair desta enrascada menos machucado. Seja ela uma mudança de chefe inspirador para um insuportável, uma demissão ou ver que a empresa era “por fora bela viola, por dentro pão bolorento”. Apenas não cometa a ingenuidade de olhar o relatório de sustentabilidade da empresa para tentar entender se lá é legal ou não. Basta olhar o da Americanas. Needless to say anything else, certo?
Com a garantia que não vai morrer de fome nem ser despejado, dá para buscar uma outra posição com a cabeça mais fria.
Não se martirize. Todo mundo já entrou numa cilada. E todo mundo mente. O LinkedIn parece o Instagram dos negócios: todo mundo mostrando suas realizações maravilhosas em suas empresas espetaculares. Só que não. A maioria é fake.
Takeaway: O diabo é diabo porque é velho, não porque é esperto. Então ouça o pessoal mais velho. Isso é como canja de galinha: no limite, mal não faz...
Regra #3: Manter-se atualizado
Foque em conhecer mais coisas, estar antenado com tendências e tecnologias. Não precisa ser expert, mas não pode ser alienado, ok? Não precisa ser o supra-sumo da IA, mas tem que já ter usado o ChatGPT pelo menos. Esteja sempre atualizado com temas fora da área de atuação, sejam de política, Economia, etc ajudam. Não dá para ficar apenas lendo livros de business, please. Pense bem: num jantar com amigos, se o pessoal só falar de um assunto, normalmente de trabalho, fica meio boring, não fica? Se você achar que não é boring, talvez você seja boring, sorry. Tudo isso te ajuda a ter mais lateralidade de carreira. Afinal, quanto mais se sobe na hierarquia, menos especialista de um assunto você é.
Takeaway: Pão quente sai rápido da padaria. Seja ele e não aquela torta de morango que não é todo mundo que gosta e às vezes ninguém compra e precisa ser descartada. Bear in mind: você é um produto apenas e ninguém é insubstituível. Basta dar um rolê pelo cemitério.
Regra #4: inteligência emocional
Aqui não é complicado de entender. Mas esse talvez seja o ponto mais relevante de uma carreira bem-sucedida. Isso já foi tema do Daniel Goleman há umas boas décadas. Tem sido requentado por consultores ávidos para vender livros com a “bola da vez” e serviços de consultoria.
Mas, desde a antiguidade, relacionamento humano é a chave de toda pessoa de sucesso. Isto é “no brainer”. Ultimamente como o pessoal não sabe o que inventar para falar as mesmas coisas de sempre, puxou lá de trás o Estoicismo, para o horror de Sêneca e Marco Aurélio.
Outro dia vi uma chamada bacana: Como o Estoicismo vai te ajudar a ter sucesso na vida. Quase morri, pois nem Sêneca nem Marco Aurelio falavam de regras para o sucesso.
Eles professavam uma filosofia de vida, que pode te ajudar a ter foco no que é importante e não se agarrar às inúmeras ilusões que a vida nos coloca frente aos nossos olhos. Com isto, você será uma pessoa com maior resiliência emocional, portanto vai sofrer menos e aprender a ser feliz. Daí a ser a chave para o sucesso, é uma enganação sem fim de quem quer lucrar em cima do pessoal que quer uma “bala de prata” para resolver problemas na vida, ao melhor estilo “click bait” em landpage que te oferece o sonho de emagrecer sem esforço, ganhar um milhão fácil, etc e tal.
Takeaway: soft skills, soft skills, soft skills. Quase todo o resto a IA vai fazer e mimetizar bem.
O fato inconteste é que quem sabe se relacionar com os outros, dado que o mundo é absolutamente político devido às inúmeras relações humanas que nos cercam, sempre foi, é e continuará a ser talvez a mais importante chave para o sucesso, através de uma vida plena e realizada. Falaremos mais sobre isso oportunamente!