Coluna
Publicado em
3/3/2023 17:40

Blur, o novo marketplace de NFTs que mostra o poder das redes descentralizadas

A criptoeconomia e a web 3.0 terá uma dinâmica distinta de tudo o que estamos acostumados
Componente decorativo no bloco representando as cores do FLJ.
Unsplash

Por Paulo Boghosian

O universo de NFTs, pelo menos no que diz respeito às colecionáveis e a arte digital, foi dominado, desde 2021, por uma companhia privada chamada OpenSea. A OpenSea cobrava altos royalties dos seus usuários, o que gerava insatisfação. A companhia era criticada por “explorar” seus usuários sem oferecer nada em troca para a comunidade de criptoativos. Além disso, sofreu com episódios onde seus colaboradores foram acusados publicamente de front running, 

Recentemente, a OpenSea ganhou a concorrência da Blur, uma nova entrante no mercado de marketplaces para NFTs, que lançou seu token e tomou o mercado de NFTs rapidamente. Em pouco tempo, a Blur tomou grande parte do marketshare do mercado da OpenSea, não apenas em volume, mas também em número de transações, se tornando a sensação do momento no mercado cripto. Muitos se perguntam como foi possível um crescimento tão surpreendente, principalmente quando considerados os efeitos de rede que esses marketplaces possuem, e os altos “switching costs” envolvidos em uma migração para um concorrente, ou assim pensava-se.  

Fonte: Dune.xyz 

A explicação está em um dos temas menos compreendidos no universo das redes descentralizadas e da criptoeconomia, que é o de “token incentives”. “Token incentives” ou incentivos de tokens em tradução livre, consiste na utilização de tokens para incentivar determinados comportamentos nessas redes. Quer dizer, cada blockchain possui seu token correspondente, e a maneira como são distribuídos, emitidos e utilizados é um mecanismo estrategicamente desenhado para moldar o comportamento dos participantes naquelas microeconomias.

Apesar de não ser amplamente conhecido, há uma área da economia e matemática aplicada que é dedicada a estudar esses mecanismos de incentivos, chamada de “Mechanism Design”, uma derivada da teoria dos jogos. Para quem não conhece a teoria dos jogos, sugiro começar pelo filme “Uma Mente Brilhante”, que conta a história de John Nash, estudioso que revolucionou essa área. Se na teoria dos jogos estuda-se a maneira com que determinados agentes se comportam em situações estratégicas chamadas de jogos; no mechanism design, estuda-se como moldar os jogos para que agentes se comportem de uma maneira desejada. 

No mercado de criptoativos, idealizadores de redes blockchain são responsáveis também por desenhar as economias dos tokens que irão alimentar essas redes. Os tokens possuem uma série de utilidades nessas redes, como pagar transações, mas também para recompensar participantes da rede ou mesmo participar da sua governança. Ou seja, esses tokens além de terem funções econômicas, são responsáveis também por incentivar a adoção e o desenvolvimento naqueles ecossistemas. 

Uma das maneiras como a adoção é incentivada nas redes blockchain é através de uma estratégia chamada airdrop. No airdrop, redes blockchain destinam uma parcela da oferta do token para serem distribuídos como doações para participantes na rede. Na prática, isso se assemelha a uma estratégia de aquisição de usuários, análogo ao que muitas empresas de tecnologia fazem. Ao receberem esses tokens, usuários são incentivados a utilizar a rede para ganhar outros benefícios, como receber uma parcela das receitas de transações na rede. 

Foi justamente através destas estratégias de incentivo que a Blur, que diga-se de passagem também possui um bom produto, conseguiu tomar o mercado da OpenSea. Os desenvolvedores da Blur foram capazes de criar incentivos bons o suficiente para superar os custos de mudar de uma plataforma já estabelecida para uma nova. É verdade também que estavam no “lugar certo, na hora certa” fazendo um ataque social em um concorrente que tinha uma marca arranhada pelas dores do crescimento rápido. Para piorar, a OpenSea não possui tokens nativos, é uma empresa no formato da economia tradicional, e portanto não goza desses mesmos artifícios para competir com a Blur. Em uma tentativa desesperada, zeraram temporariamente a cobrança de royalties em sua plataforma e já sinalizaram uma redução permanente nas suas taxas. 

Ainda há muito por vir, e esse é apenas um capítulo na disputa por esse importante mercado. Mesmo assim, há lições importantes a serem compreendidas. O episódio é um atestado do poder do design de incentivos e de um novo modelo de organizações descentralizadas. Mas mostra também que nesse universo descentralizado, é mais desafiador que uma organização consiga sustentar vantagens competitivas. Aliás, será crucial observar o quanto a economia da Blur é sustentável ao longo do tempo. 

Por fim, é importante ter em mente que se trata de um mercado em constante evolução e inovação. Não há ainda uma receita de bolo no que diz respeito a incentivos e economias de tokens, mas há a clareza de que a competição por espaços na criptoeconomia e na web 3.0 terá uma dinâmica distinta de tudo que estamos acostumados. 

*O conteúdo da coluna é de responsabilidade do colunista e não reflete o posicionamento do FLJ

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Foto panorâmica da tão famosa Faria Lima